Ocorre depois um segundo aspecto: a opção político-diplomática portuguesa pelo candidato a Director-Geral. Porquê o Ministro da Cultura egípcio Faruq Hosny, figura nada consensual e controversa, sobretudo no seio do grupo ocidental? O Egipto, Sudão, Kowait e Líbia apoiavam-no e Portugal, pelos vistos, juntou-se-lhes. Logo que se soube da sua candidatura houve reacções muito negativas de diferentes meios e não apenas conotados com a causa judaica. Hosny tentou retratar-se das afirmações, que proferira num aceso debate parlamentar no Cairo. Contudo, o esforço não valeu de muito e acabou por perder para a candidata búlgara Irina Bokova. Presume-se que dos 9 candidatos iniciais, entre os quais a austríaca Benita Ferrero-Waldner (então Comissária para as Relações Externas da Comissão da UE e ex-Ministra dos Negócios Estrangeiros da Austria) era mais conveniente o egípcio para as autoridades portuguesas . Desconhece-se os motivos específicos da opção por um natural do país da esfínge. Considerando que as relações comerciais bilaterais com qualquer daqueles países africanos e do Médio Oriente são irrelevantes, deduz-se que não foram razões de natureza económica. Talvez mais um esforço, tantas vezes tentado, para captar capitais árabes. Igualmente, Portugal nunca manteve relações político-diplomáticas próximas com nenhum dos citados estados proponentes da candidatura egípcia e até teve o cuidado de não disponibilizar tropas, durante a primeira Guerra do Golfo, que libertou o Kowait em 1991. Parece que o nosso PM, como o seu homólogo italiano, entende-se bem com o líder líbio, Coronel Kadhafi. Nada se regista, felizmente, em relação ao Sudão. Assim, o posicionamento português só se pode entender à luz da sua campanha para membro não-permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Dessa maneira, juntou-se aos países em vias de desenvolvimento ou, como se dizia antigamente, ao “terceiro-mundo”. Interessante, após 36 anos de democracia, um Governo socialista adopta a via, que nos meados dos anos setenta chegou a estar na moda e a ter alguns defensores no seu seio e noutros partidos de esquerda em Portugal: a “via terceiromundista”. Não sabemos quantos compromissos de voto de membros das Nações Unidas se obteve entre os países arábes e outros apoiantes de Faruq Hosny. E a Assembleia da República esteve, que se saiba, alheada destas manobras. Entretanto, o Governo do Eng. Sócrates comprometeu-se com um candidato capaz de no seu Parlamento, em pleno século XXI, propor um auto-de-fé para se defender de outros fanáticos. Notável pragmatismo português, que deverá ter impressionado os membros do mais relevante areópago mundial em Nova Iorque. Talvez se possa, em breve, avaliar se foi lucrativa tamanha habilidade diplomática .
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